quarta-feira, 27 de março de 2013

O homem do Bar Pescador


Primeira parte

Uma turma de amigos, na faixa etária entre 18 a 20 anos, alguns risos e alguns sonhos, celebrando as existências de ruínas que tiveram até agora e alguns apagamentos da história. A vida é uma piada. Uma música na moda ao fundo: “eu quero tchu e tcha!”.  E uma certeza exata que pra ser feliz, só basta de pouco.
Um músico se levanta e diz:
- “Porra, o Celso Russomano está tão feliz, repararam o sorriso no rosto dele quando ele fala que o Maluf não é problema dele. O Russomano diz: pergunta pro Haddad sobre o Maluf, isso é problema dele agora. O Maluf  é a batata quente que ninguém quer segurar”.
Outra mocinha fala alto, blusa vermelha e óculos escuros:
- “Apesar dos pesares, ainda prefiro o capitalismo doce da política petista que a política salgada psdebista. O Serra já era, gente”.
A Má reafirma:
-“Ainda prefiro o PT, o Serra é muito ruim”
A turma falava desses assuntos banais, enquanto olhava uma notícia de Jornal sobre a declaração do Serra discutindo o assunto  do transporte público em São Paulo,  na notícia o político tucano atacava o opositor e declarava que o bilhete era mensaleiro, tinha um título enorme em letras garrafais: “Bilhete Mensaleiro do Haddad”. O menino cabeludinho, (chamado carinhosamente pelas três meninas de “Kazinho” ou “ Trastinho”), finalmente, pergunta para todas enquanto pula em cima do corpo da Roxinho para abraçá-la: “Pra onde a gente vai?”
- “Porra, Vamo pra Cuba a pé!” (diz Mari, a moça de blusa vermelha)
- “Se a gente continuar assim, andando desse jeito, é capaz mesmo da gente ultrapassar fronteiras”. (Má ri, concordando com Mari, as duas andam abraçadas pela calçada, só três horas de conversa, mas já eram amigas de infância).


Segunda parte

Roxinha começa a cantarolar uma canção na mesa. Kazinho começa a batucar na mesa. Má também acompanha a cantoria, Mari fica batucando e puxa a dançoria. Todos acompanham o ritmo da música com o corpo, ficam fazendo isso por uns tempos. O Garçom se aproxima e pergunta:
- “ eu quero ver a carteira de identidade de vocês”
Todos mostram. Má não consegue achar nenhum documento com foto na bolsa, mostra todos os cartões de crédito e etc, até conseguir achar algum. Finalmente, compram as bebidas.
- “ é o que dá a gente ter carinha de jovenzinhos. Né não!.. Garçom”. 
O garçom responde com a cabeça afirmativamente. 
- “vamos pedir uma porção de batata fritas”
- “alguma preferência de cerveja?”
- “pra mim qualquer uma”
- “pra mim também. Será que é mais barata que no outro bar? GARÇOM, quanto que é a cerveja aqui?”
- “ seis reais”.
 A turma olha com o rosto de desconfortamento. Mas dão risada logo em seguida.
- “ eu posso só pagar uma”
- “a Má já pagou a primeira cerveja do último bar”
- “ é verdade! Deixa que a Priscila quando chegar, pague todas as rodadas...”
- “ é isso aí, ela que chega atrasada, ela que paga!”
- “ Então, gente, esse papo está com a nota 9,18!”
Gargalham. O último bar que eles estavam era lá embaixo da R. Augusta, chamado Pescador. Era um lugar mais ou menos, mesmo assim, a cerveja era muito cara, só puderam beber uma garrafa. 
A Má virou o copo, olhou e rindo disse:
-“nunca mais vou esquecer aquele cara, vocês ouviram o que ele falou quando eu perguntei de onde ele era, (as mãos em cima da mesa, os olhos fixos no copo, Má reproduzia o jeito do homem misterioso do Bar Pescador): ‘eu vim dos seus pés’”.
Kazinho encheu um copo de cerveja e colocou no meio da mesa:
-“esse é da Priscila, ninguém mexe”
- “Poxa trastinho, que maldade!”
Todos riam. Mari cruzou as pernas lentamente, olhou o rosto de Kazinho e disse:
- “Então, eu quero saber o nome da mãe de vocês, um por um:
 1) Regina -  Kazinho disse
2) Maria – Má disse
3) Neide – Kazinho outra vez, mas com uma voz de mulherzinha
4) Messias (Roxinho imitava Mari nessa cena)
MESSIAS!”
Roxinho sentou com as pernas cruzadas na cadeira. Deu risada e bebeu mais um pouco de cerveja. Mari arregalou os olhos, pegou as mãos de Roxinho e perguntou:
- “sua mãe se chama Messias mesmo. Nossa! Não posso falar da bíblia aqui. Olha gata: eu rezei tanto pra Deus pra aparecer alguma coisa boa e apareceu você, a filha de Messias”.
Mari deu risada, sentou normalmente e colocou mais cerveja no copo. Roxinho disse:
- “poxa, o cara te pegou pra Cristo...”
- “pois é, pegou mesmo. Cara doido! Ele não parecia estar bêbado só, parecia ser outra coisa, o cara conversava com Deus, você viu Má, ele dizendo que preferia morrer com essa loucura, porque ninguém podia tirar dele a experiência de ter visto Nossa Senhora”.
- “não parecia ser só bebida mesmo não”
- “não era” – respondeu Kazinho. Roxinho interrompeu com olhar de seriedade
-“Sabe o que o cara parecia. Tipo um daqueles caras cheios da grana, muito rico, que perderam tudo, teve que dividir a herança com mais quatro ou cinco pessoas. Só ficando com o terreno dele e os pés de cajueiro, na maior decadência”.
- “tipo isso mesmo. Mano, acho que ele era budista, sei lá, mas ele tava muito louco”
-“ se a gente deixasse, ele ia beber mais cerveja nas nossas costas, viram a interpretação que ele tinha feito, dizendo que tinha esquecido dinheiro em casa”
-“ não esqueça a perninha cruzando” – Kazinho puxando a piada. Todo mundo rindo junto.
- “ e a mãozinha ao vento, lembra Mari..”
- “lembro Má, ele falando que não esperava mais nada da vida, já tinha perdido tudo. Aí Deus falou que ia levar a mãe dele embora, (imitando o homem do pescador, a mão direita em cima das orelhas e mexendo os dedos): ‘quer levar a minha mãe embora, então leve... Adeussss!’ Não dá pra enfrentar a morte. Ela sempre ganha.”



Terceira parte

O homem do Bar Pescador é careca, rebola a bunda enquanto anda, usa camisa branca, uma calça cinza toda mixada. Um restinho de cabelos brancos na barba e atrás das orelhas, caminha por entre os bares esperando que alguém o escute, procurando compreensão. Mas todos fogem dele.
Segurando a mão da filha de Messias, ele olha nos olhos da mocinha, bem arregalados. Depois de ter aberto o coração para aqueles jovenzinhos, espera o que deles? Segura nas mãos da mocinha.
A mocinha diz: “Tá tudo bem!”
O homem do Bar Pescador: “Eu preciso ir ao banheiro. Gente, eu vou, mas esperam, porque essa conversa está com a nota 9,18” 
A turma de amigos sai de fininho, correndo na calçada já misturada com as cores noturnas. Eles gritam: “vamo ver gente bonita, metida e descolada!”.
A mocinha diz: “Cara doido! E ele: ‘sou contra o homossexualismo. Não, Não, não é contra, essa palavra é muito forte. Mas eu não dou a bunda pra ninguém, um monte de gente quer comer ela, mas não dou, não dou!... Eu só como a bunda dos outros’”.
Roxinho diz: “ eu gosto de ver gente assim, o povo do teatro me levava pra conversar com esse pessoal”
Kazinho: “ é capaz da Mari fazer um conto sobre isso, do jeito que eu conheço essa menina”
Mari: “ Ei trastinho! Vamo pra outro bar, o Kazinho paga tudo dessa vez!” 





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