sexta-feira, 15 de março de 2013

Ar


Eu ando respirando com dificuldade. Não é mais oxigênio que está no meu corpo, é um outro tipo de ar que respiro. Não, também não é o monóxido de carbono que me acostumei a respirar, essa cidade fede e estou acostumada com seu cheiro. Ar seco, vento cortante. O ar que não consigo botar pra dentro e pra fora é outro, tem outro nome. Nome que não consigo nomear.
Na minha frente, dois homens queimando um. Atrás de mim, um fotógrafo bonito. (Preciso comprar o presente pra minha tia, o aniversário dela é amanhã). É um ar só meu, acho que é o efeito egoísta que aprendi nas escolas. Estou sim, sendo a pessoa que me ensinaram ser. Ser mais eu e só eu, os outros não me importo, não tenho tempo. Só tenho tempo pra mim.
Passo numa rua cheia de mendigos, me lembro, então, da frase de um rap: “eu sou o resto do mundo, eu queria morar numa favela, o meu sonho é morar numa favela”. Mais ou menos assim ou coisa parecida. Não sei o que eu faço? Eu relato: não seria um fetiche. Não relato: não seria omissão. Isso tudo não é os efeitos do que a gente escolheu (ou que escolheram pra gente e não opinaram se a gente também queria?). 
Esse ar está difícil. É um ar que pesa. Ninguém te olha, todos estão em si. Talvez, respirando o mesmo ar grosso e sem nome que nos rodeia. Um ar que está no limiar do ser humano, não gostamos de sentir, nem sabemos se isso é ar ou se é sinal de morte na vida.  Por quanto tempo uma pessoa vive sem respirar?  Não consigo dizer que limiar é esse. Isso não ajuda, ainda continuo respirando difícil. Dizer que é um ar incognoscível não ajuda compreender e explicar a natureza desse elemento natural. Poderia perguntar: o quanto de natural eu fui ensinada a não respirar? O contrário também valeria: o quanto de banal esse ar pesado e inominável estava em mim e no meu cotidiano, mas não percebia respirar?
Dou voltas pela cidade. Perambulo... Perambulo... Penso em contos, penso em Arte, penso em sonhos. Rio comigo mesma, sou cruel com o meu consciente. Um velhinho me paquera, eu nem respondo, finjo que nem ouvi...Perambulo...Perambulo... O ar me pesa, faz parte de minha identidade, quero longe de mim, mas não consigo. O ar é mais forte, meu corpo apreende ele como sangue. Meu cérebro foi oxigenado por esse novo elemento. Não, o ar é meu, mas também é nosso.
Perambulo. Desisto de escrever sobre tudo, canso de respirar, tampo a respiração. Não adianta, o ar é todo manipulado por meu corpo. O corpo é tão eu quanto a mim. Desisto de pensar na definição disso, não faço mais Arte de banalidades. De que adianta a Arte se o ar oxigena todo o meu sangue? De que adianta a poesia se ninguém respira direito? Eu não respiro, eu finjo que respiro para sobreviver.
Perambulo... Perambulo....

Nenhum comentário:

Postar um comentário