terça-feira, 25 de dezembro de 2012

As coisas perigosas do amor


Qual é a coisa mais perigosa do amor? Uma mulher adulta me respondeu: pequena, tudo se começa pela boca.
Qual é a coisa mais perigosa do amor? Perguntei para as minhas amigas, elas me responderam: aaah, pequena! É o beijo. É o cheiro.
Mãe, qual é a coisa mais perigosa do amor? Filha, minha pequena, é o silêncio.
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Curiosidade mata um homem.
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Estava em um bar. Tomava cerveja. Falava coisas banais com um menino.
- blá blá blá blá
- blá blá
- batatas fritas
- blá,  porção de batatas
- tem muita batata
- blá blá
Em um minuto distraído, sem interesse de chamar atenção do rapazinho que estava na minha frente. O olhar do outro abateu em mim uma certa timidez. O desconforto de silêncio pairou sobre nossas cabeças.
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Um olhar. Eu estava vestida com uma blusa e calça jeans. Ele estava vestido com calça jeans e uma camisa estampada. O que ele olhava tanto? De repente, senti um conhecimento nascendo dentro da minha ignorância sobre essas coisas que acontecia entre duas pessoas. Entendi como o meu corpo era tão diferente de outros corpos. Um desses conhecimentos que nós aprendemos no meio do ato-se-fazendo. Se existe alguma diferença entre o homem e a mulher, além do pau e da buceta , eu não sei. (Samuel Rawet diria isso ou  será que Henry Miller diria? Acho que essa frase podia ser escrita por um dos dois.)
Mas, naquele instante, senti a diferença do meu corpo em comparação com os outros. A solidez ficou evidente. Aquele corpo (o meu corpo) causava uma sensação diferente a esse moço, que pagava minhas batatas fritas.  Essa sensação remexia a imaginação dele. Senti um temor, tremendo o meu rosto, fiquei corada. Acho que ri, desviando os meus olhos. O que diferencia um moleque de um homem é o olhar. Esses olhos, (o olhar do moço das batatas fritas), tiravam a minha roupa, me deixavam nua, devagarzinho, sem medo e pudor. Isso é terrível. Ah que olhar terrível! Nesse momento, a única certeza que pairava na minha cabeça, era a seguinte: “como é impossível manipular a imaginação do outro, eu posso estar fazendo qualquer coisa na cabeça desse menino e eu não sei. Não tenho controle. Ao mesmo tempo que é sedutor, também é perturbador, eu sou a imaginação dele sem ser eu. A imaginação não é minha”.
O olhar terrível me deixava tão vulnerável, sem poder de controle, desnuda. Eu tinha tanta consciência de corpo. Os olhos enxergavam os meus pés, a cabeça, a pele e etc. Não tinha como fugir, a imaginação dele se presentificava no silêncio. Esse olhar era a coisa mais perigosa dos homens.
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Um movimento pequeno pode ser arrebatador e transparecer a vulnerabilidade do outro. Sempre me traí com o olhar, os olhos denunciam tudo. Aquele rapazinho que provocou essa sensação, nunca beijou na minha boca. Viramos amigos depois. Ele também nunca mais me olhou desse jeito (nunca percebi ao menos) e, no final, crescemos juntos como cúmplices de pentelhices.   
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Estava nua, deitada na cama, olhei as grandes costas daquele homem. Vi, então, a tatuagem de lobo e um nome de mulher escrito em letras gigantes. Respirei como um suspiro; um segredo imenso separava o meu corpo e o corpo dele. Nunca perguntaria. Ele se virou para mim, nenhuma palavra foi trocada entre nós dois, a boca com a boca, o ar separando apenas. Um beijo. Muitos silêncios pronunciariam as horas.
Gozou dentro de mim. Ficou parado, segurando os meus cabelos. Respirava perto do meu ouvido como se tivesse me contando um segredo sem palavras. Algo que jamais poderia comunicar, eu demoraria tanto tempo para entender esse momento.
Separamos. Ele olhou para o teto. Permaneci no mesmo lugar.
De repente, as mãos dele sobre as minhas pernas. Aconteceu o inesperado. Ele me olhou. Aquele mesmo olhar terrível que o rapazinho do bar tinha olhado uma vez. Entendi tudo, como era perigoso! Era o olhar mais indecente do mundo. Nua, ele me imaginava mais nua. Claro que não! Pequena, ele queria mais, queria mais sacanagem. Queria muito. A palavra querer era advérbio de intensidade. Muito era segredo.
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Mamãe jamais me perdoaria. Mas também, depois de entender qual era a coisa mais perigosa do amor, entendi qual era o risco do prazer. (Não existem santos e puritanos na hora que viram os olhinhos!). Como é terrível não manipular a imaginação do outro, é terrível aceitar que não temos o controle de tudo. O risco do prazer é intransferível, deve ser essa a mesma sensação de assassinar uma pessoa. Incomunicável. 

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