domingo, 25 de agosto de 2013

Ensaios sobre Amor: O estranho desaparecimento do Belo

Ele não conhecia nenhuma garota, saia de casa sempre às seis horas da tarde e dormia exatamente às dez da noite. Certo dia, ele conheceu Alessandro, era um mulherengo, dormia com muitas garotas e, sabe-se lá por que motivo, esse rapaz gostou do tímido Gabriel. Eles se conheceram em um sábado, exatamente umas seis e três da tarde.
- o que você está fazendo?
- nada. Caminhando
No dia seguinte.
- o que você está fazendo?
- nada. Caminhando
Na semana seguinte, Alessandro paquerava uma menina bonita, mas quando viu o mesmo rapaz atravessar a rua, agiu da mesma forma e até se esqueceu da mulher que estava ao seu lado.
- o que você está fazendo?
- nada. Só caminhando

Alessandro ficou ensimesmado. Porém, não sabia como fazer a aproximação com o tímido Gabriel, a curiosidade foi abatendo o seu íntimo, queria conhecer a história desse rapaz. Até onde Alessandro observava, Gabriel lhe parecia mais jovem que ele e muito distraído, não parecia ter muito jeito com as coisas, andava desengonçado, mas chamava atenção por todos que estavam na mesma rua.
De repente, Gabriel parou de andar e viu uma moça exuberante atravessar o caminho, era uma mulher que tinha cabelos longos, peitos fartos e usava minissaia. Alessandro percebeu que o olhar do rapaz tímido mudou radicalmente, permaneceu sentado para observar qual seria o próximo passo dele. Nada aconteceu, Gabriel viu a mulher passar e, no olhar, tinha uma expressão de tristeza, parecia que o horizonte estava mais longe que aparentava, os limites tendiam ao infinito. Ele se sentou sobre o chão.
- o que você está fazendo? – perguntou Alessandro
- olhando a Beleza que passa – respondeu Gabriel
- e por que não vai atrás dessa mulher?
- porque prefiro sentar aqui
- o que tem aqui?
- tem você – Gabriel mostrou os dentes timidamente
Alessandro riu, tinha esquecido que sentia atração por mulheres. Olharam-se muitas horas, perderam algumas noções de espaço e esqueceu que era quarta-feira.

Na semana seguinte, Alessandro sentou no mesmo lugar que o Gabriel. Esperou, mas ele não apareceu. Andou até o lugar que tinha passado a mulher bonita, mas não encontrou o tímido rapaz. Perguntou para uma senhora com roupa rosa, ela respondeu: “não vi nenhum menino assim”. Ele procurou por todos os lugares, perguntou para moça que paquerava na última quarta-feira, essa menina respondeu: “que menino? Você não estava sozinho?”.
Alessandro ficou com dúvida, se, de fato, ele tinha conhecido aquele rapaz tímido. Se não era uma espécie de ilusão criada na cabeça. Perguntou para o moço que vendia sorvete: “ licença, você viu um rapaz tímido, usando roupa azul e com um bigodinho discreto, ele falava esquisito e tinha sotaque que não era de São Paulo?” O homem respondeu: “não vi ninguém assim”. Alessandro parou subidamente no meio do caminho, voltou ao lugar que tinha sentado antes. Olhou para o céu, então, lembrou-se que tinha o telefone do Gabriel.
Fez o telefonema, a senhora que atendeu disse: “esse rapaz não mora aqui não”. Alessandro tossiu e empalideceu. Ele se lembrou das palavras do tímido Gabriel: “estou olhando a Beleza que passa”, pensou no sorriso bobo dele, sentiu saudades. O que tinha acontecido com aquele rapaz? Passaram duas horas, Alessandro não entendia. Não conseguiu encontrar evidências para solucionar o misterioso desaparecimento do rapaz tímido.
Quando ele atravessou a rua para ir à sua casa, encontrou uma pulseira. Gabriel tinha sido atropelado por um caminhão. Estava uma grande confusão em volta dele, Alessandro se lembrou da última frase que Gabriel tinha falado: “estou olhando a beleza que passa”. Ele, um homem alto, cabelos pretos e olhos confusos, olhou a morte de perto e pensou: “estou olhando a beleza morrer”.

No IML, um corpo de baixa estatura, com um bigodinho discreto e olhos sonhadores estava esquecido. Duas semanas depois ninguém foi procurar por esse corpo. Alessandro perguntou por Gabriel, a moça de vinte anos que atendeu, disse que tinha um corpo que podia ter essas características lá. Alessandro mentiu, disse que era irmão e que queria procurar o corpo, pois havia sumido por duas semanas. 
- é esse daqui – A moça mostrou o último corpo
Ele olhou, respirou fundo e pensou: “estou olhando a beleza morta”.
- é sim – tentou engolir o choro.
- quando tempo ele está aqui?
- duas semanas


Na quarta-feira, Alessandro paquerou uma garota. Dormiu com essa menina, olhou os olhos da garota e só conseguia lembrar a frase do tímido Gabriel: “estou olhando a beleza que passa”. Marcela que tinha uma vitalidade no olhar, percebeu que Alessandro estava distante e perguntou:

- o que você tem?
- eu não esqueço
- você não esquece alguém?
- sim – Alessandro respirou profundamente -, era alguém que tinha um sorriso muito bonito
- o que aconteceu?
- sumiu – Alessandro virou de lado e olhou para menina, ele tinha olhos confusos -,  Má, será que eu criei uma imagem na minha cabeça? Será que a gente inventa imagens de beleza?
- que que você tá querendo dizer?
- acho que me apaixonei por uma imagem, mas não tenho certeza se ela existe, não sei se aquele rapaz que eu vi na rua, foi fruto na minha imaginação, se foi sonho ou se foi delírio. Agora, agora, agora. Ele sumiu
- por que você não correu atrás?
- aí que está – suspiro longo – eu fui atrás dele em todos os lugares, eu liguei para casa dele. Foi uma senhora com uma voz horrorosa e brava que me atendeu e me disse: ‘não tem ninguém com esse nome que mora aqui’. De repente, voltando para casa, eu encontrei uma pulseira, Má, essa pulseira aqui – ele mostra o seu pulso – você vê! Essa pulseira é real, eu estou usando ela
- então, esse menino existiu
- será? Má, eu encontrei ele morto em uma calçada, ele apareceu como uma faísca e com tanta vitalidade e tanta energia, sumiu com pressa e hoje, agora, eu aqui, não consigo esquecer, não sei se isso foi produção minha, se fui eu quem produziu ele, não sei se ele já estava morto ou se não era para encostar naquela pessoa?
- Lê, parece que você não está falando coisa com coisa
- Má, – acariciou os cabelos dela – você acha que é possível a gente vivenciar coisas e não ter certeza sobre as suas próprias vivências?
- como assim?
- Má, eu procurei esse rapaz por tudo que é canto, eu menti pra encontrar esse rapaz, eu fui na puta que pariu, quando eu encontrei, ele estava morto. Mas, no IML, esse rapaz estava morto já fazia duas semanas, será que ele tinha morrido atropelado mesmo? Será que eu inventei esse rapaz? Será, Má, que eu estou inventando tudo isso pra te contar essas coisas?
- Lê, você tá meio aflito, não é
- Má, será que eu inventei – ele para subitamente, parece que ele não tem coragem de dizer -, será que as coisas que eu senti perto desse rapaz foram mentiras? Será que eu inventei tudo isso?

Passaram cinco anos, Alessandro casou com Maurício, um rapaz menos bonito que Gabriel, mais extrovertido, mais normal. Alessandro reencontrou a Marcela, ela perguntou:

- como você está?
- eu estou bem – respirou – mas, ainda não esqueço, Má
- o que você não esquece?

- Má, eu não esqueço a beleza que eu vi morrer 

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