Fico
assustada também comigo e com a minha imagem. O mundo me assombra, diante
disso, resta apenas um vácuo. Devo questionar esse vácuo? Será que esse
desassossego com qual eu me assombro todos os dias tem alguma relação com o meu
ser ou com a imagem do meu ser? Desse ângulo, o espanto é tão grande que,
ocasionalmente, faz a pergunta mais imprecisa diante das coisas, me leva como
um tropeço às questões: quem sou eu? Pra aonde vou? Onde estou?
Interrogar
o vazio é o mesmo que pedir conselhos amorosos para parede. Nada acontece. E o
nada é instigante e terrível, ele pode ser preenchido de futuro e aprisionado
de passado; eu tenho que perguntar também até que ponto essas categorias “futuro”
e “passado” respondem a pergunta vital: que horas são? Vinte minutos para viver
mais ou para viver menos. Tudo é tão insólito, não agarro nada nas mãos,
questiono também a pergunta. Olho a mim mesmo e não tenho certeza se essas
perguntas são minhas, se eu as criei realmente ou se falaram para mim que eu
deveria fazê-las.
Tenho,
então, o sujeito que pode ser, facilmente, embriagado com conhaque ou com a
sobriedade de um destino com valores burgueses, - um sonho de família como um
comercial de margarida e café com leite pela manhã. Embriago-me com receitas de
bolo ou com porres todas as sextas-feiras para esquecer a angústia? Mas que
angústia é essa? Sou muito contaminada por sentimentos, não enxergo as coisas
por que sinto demais, ao contrário, não enxergo as coisas porque evito sentir.
Sonho
contaminado de competitividade e perfeição! Amor impregnado de exclusividade e
puritanismo! Frases repetidas, pessoas iguais, discursos proferidos em bares e
museus, tudo repetido. De que adianta responder perguntas mutáveis se o mundo
me foge dos olhos e os acasos são tão iguais? Minha memória é o peso que
carrego no cotidiano, a imaginação é maldita, não vejo solidez e concretude nas
relações, as coisas desmancham e o ar fede. O mundo parece sem saída. Evito
sentir a angústia, a fuga pelos meus sentidos, iniciando pelo corpo é a melhor
saída, não sinto mais as coisas, suicido devagar, roubando de mim mesmo,
primeiramente, a minha vontade de viver.
Dessa
maneira, volto o pensamento a mim mesmo, não estabeleço mais relação com os
outros, estou triste, cansada e morta demais para estabelecer vínculos e buscar
uma saída. Não me aventuro criar novas coisas, reproduzo em mim um mito de
felicidade e, para respirar, paro de interrogar e de indignar diante das
coisas. O mundo não tem saída.
No
fundo disso, sozinha no quarto, não olho mais nada, as coisas tendem a ser o
que eu olho para elas, fecho os olhos. Fujo, mas, lá dentro, questiono-me: quem
disse que os mortos não andam e respiram entre os vivos? De olhos fechados,
paro de fazer perguntas, não corro riscos de enlouquecer parando de interrogar,
ficarei sã, ficarei sã, ficarei sã... De olhos fechados ainda, repito essas
frases como um mantra, sinto sono, caminho até cama, abro os olhos, a cama é
exatamente uma cama. Durmo, não tenho sonhos durante a noite, mas acordo diante
de uma realidade que mais parece ficção, devo viver um pesadelo.
Eu vi o sol baixar, sujo de horrores místicos,
ResponderExcluirPara se iluminar de coagulações cianas,
E como um velho ator de dramas inartísticos
As ondas a rolar quais trêmulas persianas!
Sonhei com a noite verde em neves infinitas,
Beijo a subir do mar aos olhos com langores,
Toda a circulação das seivas inauditas
E a explosão auriazul dos fósforos cantores!
Rimbaud Bruninha... Rimbaud!!!